Transcrição Violência física: indicadores e mecanismos
Mecanismos de danos diretos e indiretos e letalidade
A violência física representa a manifestação mais visível e tradicionalmente reconhecida do abuso doméstico, mas a sua compreensão técnica exige ir muito além do hematoma superficial.
Como especialistas na matéria, devemos categorizá-la não apenas pela lesão resultante, mas pela intencionalidade do controlo subjacente ao ato.
Esta violência configura-se através do uso intencional da força, seja de facto ou como ameaça, abrangendo um espectro de danos que inclui mecanismos diretos e indiretos.
Entre os mecanismos diretos, encontramos as agressões clássicas, como tapas, socos, queimaduras e o uso de objetos contundentes.
No entanto, existem mecanismos indiretos ou passivos que são igualmente letais e muitas vezes passam despercebidos numa avaliação superficial.
Entre eles destaca-se a privação de necessidades básicas, como impedir o sono, o que constitui uma tática de tortura psicológica destinada a enfraquecer a resistência física e cognitiva da vítima.
Também se inclui a negação de assistência médica crítica ou a imposição do consumo de substâncias para anular a vontade.
Um indicador de risco extremo que todos os profissionais devem monitorizar é o estrangulamento não letal.
As estatísticas forenses são contundentes: uma vítima que sofreu uma tentativa de estrangulamento tem sete vezes mais probabilidades de ser vítima de homicídio no futuro.
Portanto, a gravidade da violência física não deve ser avaliada apenas pela "marca física" ou pela incapacidade médica visível no momento da denúncia, mas pelo potencial letal revelado pela dinâmica da agressão e pela intencionalidade de exercer poder total sobre a vida do outro.
Reconhecimento forense de lesões e padrões defensivos
A identificação pericial da violência física requer uma observação clínica apurada e treinada, uma vez que os agressores costumam agir com uma instrumentalidade calculada.
Frequentemente, eles direcionam os golpes para áreas do corpo cobertas por roupas, como o tronco, as coxas ou as costas, para evitar a detecção social e manter a fachada de normalidade; esse fenômeno é conhecido tecnicamente como "padrão de maiô".
É fundamental que o avaliador distinga entre lesões ofensivas e defensivas para reconstruir a mecânica dos fatos.
Feridas localizadas nos antebraços, palmas das mãos ou solas dos pés geralmente indicam inequivocamente que a vítima tentou se proteger de um ataque ativo, cobrindo o rosto ou o corpo.
Da mesma forma, a presença simultânea de lesões em diferentes estágios de cicatrização — por exemplo, hematomas de diferentes cores (violáceos, esverdeados, amarelados) — sugere um padrão crónico, repetitivo e sistemático, descartando a hipótese de um evento isolado ou acidental.
O especialista deve manter um alto índice de suspeita diante de explicações incongruentes sobre a origem das lesões, tais como «caí das escadas» ou «bati com a porta», especialmente quando essas narrativas não coincidem com a biomecânica do trauma observado nem com a gravidade dos ferimentos.
A avaliação deve ser integral, entendendo que a ausência de sangue ou fraturas não implica a ausência de risco vital.
Resumo
A violência física transcende o hematoma visível; define-se pela intencionalidade de controlo através do uso da força. Inclui mecanismos indiretos letais, como a privação do sono, concebidos para enfraquecer a resistência psicológica da vítima.
Um indicador de risco extremo é o estrangulamento não letal. As estatísticas forenses revelam que ter sofrido este ataque multiplica por sete as probabilidades de homicídio futuro, evidenciando uma intenção de domínio total sobre a vida.
A nível forense, é vital distinguir lesões ofensivas das defensivas para reconstruir os factos. Os agressores instrumentais costumam bater em áreas cobertas pela roupa, padrão conhecido como «fato de banho», para evitar a deteção social.
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